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Sustainable Development Project for Agrarian Reform Settlemen North-East (Dom Hélder Câmara Project)

03 Dezembro 2011

Introdução

Objectivos. Em conformidade com a decisão aprovada pelo Conselho de Administração do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) na sua 98.ª sessão, realizada em 15 de Dezembro de 2009, o Serviço de Avaliação do FIDA efectuou uma avaliação intercalar do Projeto de Desenvolvimento Sustentável dos Assentamentos de Reforma Agrária do Semi-Árido Nordestino (Projeto Dom Hélder Câmara - PDHC), no Brasil. Os objectivos desta avaliação eram os seguintes: (i) avaliar os resultados e o impacto do projeto; e (ii) extrair conclusões e recomendações que orientarão uma possível fase seguinte do projeto.

Antecedentes do projeto. O PDHC foi concebido para dar resposta às carências em termos de assistência técnica e de oportunidades de desenvolvimento social e geração de rendimentos com que se confrontavam os agricultores e as comunidades estabelecidas recentemente no Semi-Árido Nordestino, ao abrigo do processo de reforma agrária. O custo inicial do projeto ascendia a 93,0 milhões de USD, que incluíam um empréstimo do FIDA no montante de 25,0 milhões de USD. A concepção do projeto não previa co-financiadores, mas a Unidade de Gestão de Projeto (UGP) conseguiu mobilizar fundos suplementares, concedidos por parceiros nacionais e internacionais. Os objectivos do projeto eram os seguintes: desenvolver uma cultura de coexistência com as condições semi-áridas da região do Nordeste do Brasil e assegurar que as famílias que viviam nos assentamentos da reforma agrária e nas comunidades rurais vizinhas pudessem ter uma vida digna e constituir modelos de desenvolvimento humano sustentável. O grupo-alvo consistia em 15 000 famílias dos assentamentos da reforma agrária federal e de comunidades vizinhas dos estados do Ceará, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Sergipe e Piauí.

O PDHC distinguia-se por institucionalizar a participação das bases no planejamento, através de comités territoriais constituídos por representantes das comunidades, dos sindicatos, dos prestadores de assistência técnica, das assembleias municipais e do PDHC; esses comités aprovam anualmente decisões sobre as propostas de financiamento a apresentar. Nomeadamente, o PDHC estabeleceu uma relação de trabalho auto-regulada entre três grandes grupos de intervenientes: (i) os beneficiários e as suas organizações; (ii) os mobilizadores sociais – sindicatos rurais; e (iii) os prestadores de assistência técnica, geralmente organizações não governamentais (ONG). O PDHC inventou um conceito mobilizador e facilmente comunicável – Conviver com o semi-árido – para promover a ideia de que os agricultores familiares podem estabelecer uma relação sustentável com o ambiente do Semi-Árido Nordestino, desenvolvendo simultaneamente as suas competências profissionais e empresariais.

O empréstimo concedido ao Governo para o financiamento do PDHC foi aprovado pelo Conselho de Administração do FIDA em Dezembro de 1998. O projeto era supervisionado directamente pelo FIDA. Nos termos do acordo de empréstimo original, o projeto deveria terminar em Junho de 2007, mas após terem sido aprovadas duas prorrogações, a data de termo do empréstimo foi adiada para Dezembro de 2010.

Resultados da execução

A fase introdutória do PDHC foi difícil. O PDHC tinha de estabelecer parcerias com as autoridades estatais, as ONG e as organizações da sociedade civil, com vista à aplicação da abordagem proposta. O carácter inovador do conceito e a resistência de alguns parceiros potenciais afectaram a adopção da estratégia. Nos anos de 2003–2005 foi amadurecida a estratégia conceptual do PDHC, em combinação com o compromisso do Governo de apoiar iniciativas de redução da pobreza rural e de dar resposta às necessidades dos agricultores familiares. Nos anos posteriores a 2005, a estratégia do PDHC em benefício do grupo-alvo começou a ser plenamente aplicada: foram introduzidas novas actividades, em resposta a uma nova procura por parte do Governo e dos agentes do sector privado, e foi dada mais atenção à busca de parceiros internacionais interessados em apoiar e co-financiar  actividades consentâneas com os princípios do PDHC.

Organização do desenvolvimento social. O PDHC apoiou 346 associações de beneficiários. As organizações sociais que receberam formação ao abrigo do projeto (principalmente os sindicatos) desempenharam um papel importante no âmbito desta componente.

O projeto prestou formação a uma rede de 113 mobilizadores sociais, que passaram a ser responsáveis por motivar a participação dos membros da comunidade nas actividades do projeto, prestando informações sobre oportunidades disponíveis ao abrigo dos programas governamentais, ajudando a organizar iniciativas para grupos de interesses, promovendo ligações com os prestadores de assistência técnica e supervisionando as  actividades, para garantir uma utilização correcta dos recursos financeiros do PDHC.

Desenvolvimento da produção e da comercialização. O projeto contratou 65 ONG para prestarem serviços de assistência técnica, extensão rural e aconselhamento, promovendo a participação dessas organizações em iniciativas de reforço da capacidade numa série de áreas técnicas. O PDHC organizou 372 unidades de demonstração para o reforço da capacidade agrícola e financiou 511 iniciativas sociais e de produção propostas por associações de beneficiários, no âmbito do Fundo de Investimento para Projetos Sociais e Produtivos (FISP). As propostas de unidades de demonstração e do âmbito do FISP foram formuladas por associações de beneficiários e revistas pelos comités territoriais. Após a aprovação, os fundos eram transferidos para as associações de beneficiários, para aquisição de factores de produção e execução de actividades. O PDHC ajudava as explorações familiares a criarem oportunidades de acesso aos mercados, através de dois canais de compras principais: (i) os mercados institucionais constituídos pelo Programa de Aquisição de Alimentos do Governo; e (ii) a criação ou expansão de 36 feiras agro-ecológicas.

Desenvolvimento dos serviços financeiros. Ao prestar formação a profissionais das ONG e das cooperativas de crédito, o PDHC procurava eliminar um dos principais estrangulamentos do sistema de concessão de empréstimos PRONAF – a falta de pessoal qualificado que ajudasse os clientes a elaborarem propostas de crédito aceitáveis. O Banco do Nordeste desembolsou 43,0 milhões de reais  (25,0 milhões de USD) em 9 780 operações de crédito promovidas pelo PDHC, um montante inferior aos 40,0 milhões de USD afectados aquando da concepção do projeto. A principal razão dessa redução foi o endividamento dos beneficiários-alvo do PDHC, resultante da participação em programas de crédito anteriores. O PDHC facilitou a prestação de serviços financeiros a nível das bases, apoiando o reforço de cinco Cooperativas de Crédito Rural e Economia Solidária (ECOSOL).

Ensino e formação. O PDHC incluía várias iniciativas de reforço da capacidade das famílias de agricultores, destinadas a aumentar os conhecimentos em matéria de ambiente e a melhorar as condições de vida. Foi iniciada uma série de actividades educativas contextualizadas, dirigidas a crianças, jovens líderes e profissionais, professores, agricultores adultos. O PDHC utilizou nas actividades de alfabetização de adultos um método inovador que se caracterizava por proporcionar aos professores incentivos baseados nos resultados.

Foi também prestada formação contextualizada específica às comunidades quilombola. No âmbito desta componente, o PDHC financiou o programa Escola Família Agrícola, que aplicava o método da alternância pedagógica (ensino em sala de aula,  alternando com aprendizagem prática). Foi ministrada formação técnica a jovens dos dois sexos, com o objectivo de facilitar o emprego desses jovens em organizações sociais.

Género, idade e etnicidade. O PDHC integrou as questões de género, idade e etnicidade, enquanto questões transversais, em todas as suas componentes, incluindo as unidades de demonstração, o  FISP e os programas de crédito. Os principais objectivos consistiam em promover a participação de homens e mulheres de diferentes idades, reforçar o papel dos jovens e promover o desenvolvimento das comunidades quilombola. No que se refere ao género, uma acção importante foi a campanha de emissão de documentos de identidade para as mulheres, em que participaram 14 257 mulheres e que foi depois alargada a todo o Brasil pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário.

O projeto Sertão. O Projeto Manejo Sustentável de Terras no Sertão é um dos 32 projetos financiados pelo Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) no Brasil.O projeto dispõe de um orçamento de 15,5 milhões de USD, dos quais 5,8 milhões de USD são disponibilizados pelo GEF, através de uma subvenção, e 10,0 milhões de USD pelo Governo do Brasil. O projeto baseia-se numa estratégia adoptada pelo PDHC a que foi acrescentada uma dimensão ambiental transversal, destinada a gerar um modelo de minimização das causas e dos impactos negativos da degradação dos solos no ecossistema da caatinga, através do uso sustentável da terra. O projeto financiou uma série de actividades que envolviam a aprendizagem experimental, incentivos ambientais, a introdução da educação ambiental nas escolas, métodos de produção biológica e a monitorização dos efeitos ambientais  nos territórios-alvo.

Projeto ELO. Este projeto foi financiado pela Fundação Syngenta, com o objectivo de criar oportunidades de emprego nas zonas rurais, através do acesso a tecnologias de produção adequadas, do apoio à indústria agro-alimentar, do acesso aos mercados e da certificação dos produtos. O projeto promoveu a criação de 19 instalações de transformação de diferentes produtos de mercado, tais como mel e castanhas de caju, contribuiu para lançar oito novas marcas de produtos e facilitou a instalação de dez feiras agro-ecológicas.

Desempenho do projeto

Relevância

O PDHC era coerente com a estratégia do FIDA para o país, mas continua a ser o único projeto financiado pelo FIDA em que o empréstimo é gerido a nível federal, ao contrário do que é preconizado no RB-COSOP 2008 (Programa de Oportunidades Estratégicas para o País – Baseado em Resultados), que é favorável a uma administração estadual dos empréstimos do FIDA. O PDHC foi além do simples alinhamento com as políticas governamentais, na medida em que foi concebido para facilitar a aplicação de várias políticas públicas centradas nas famílias de agricultores pobres. O PDHC conseguiu colaborar de forma diferenciada com diferentes segmentos da sociedade. Adoptou uma abordagem pragmática de capacitação das mulheres das zonas rurais, identificando as suas necessidades e incentivando a constituição de grupos de interesses de mulheres, centrados na produção e em actividades de geração de rendimentos. Uma sequenciação correcta das actividades contribuiu para conferir relevância ao projeto: o objectivo inicial do PDHC era o desenvolvimento imediato do capital humano e a melhoria do nível de vida; o trabalho efectuado posteriormente no domínio do desenvolvimento da produção destinava-se a aumentar a segurança alimentar e a promover gradualmente a participação nos mercados. As infra-estruturas no sector da água financiadas pelo  PDHC davam também resposta a uma necessidade importante das famílias rurais pobres.

Algumas das dificuldades que surgiram no decurso da execução estão relacionadas com características específicas da concepção do projeto: a inclusão de seis estados, sendo embora justificada pelos objectivos do projeto, contribuiu para uma maior complexidade da respectiva execução, supervisão e acompanhamento. Porém, o facto de a gestão do empréstimo do PDHC ser efectuada a nível federal libertou em grande medida o projeto de restrições burocráticas e permitiu-lhe estabelecer uma série de parcerias e aplicar experimentalmente novos mecanismos de apoio à agricultura familiar. O aspecto negativo consistiu no facto de que a orientação estratégica a nível do governo federal não foi forte e de que a execução das actividades do PDHC foi por vezes atrasada por uma afectação insuficiente e tardia dos fundos de contrapartida.

Eficácia

O PDHC caracterizou-se por um desempenho satisfatório em termos de eficácia. O projeto teve efeitos positivos para a capacidade de os agricultores familiares se organizarem em associações autónomas. Antes do projeto, muitas associações de beneficiários só existiam no papel e não eram consideradas como um instrumento de capacitação ou de acesso a oportunidades disponíveis ao abrigo das políticas de desenvolvimento governamentais. O PDHC inventou um conceito mobilizador e facilmente comunicável  – Conviver com o semi-árido – para promover a ideia de que os agricultores familiares podem estabelecer uma relação sustentável com o ambiente do Semi-Árido Nordestino, desenvolvendo simultaneamente as suas competências profissionais e empresariais. Outro grande mérito do PDHC consistiu na sua contribuição para atenuar uma das principais restrições ao desenvolvimento agrícola do Semi-Árido Nordestino, o acesso à água. Porém, em muitas comunidades a água continua a ser escassa e a gestão de recursos hídricos limitados deve ser melhorada.

As campanhas de alfabetização de adultos produziram bons resultados, em consequência da utilização de um método de aprendizagem inovador, inspirado por uma das ONG parceiras, que proporcionava aos professores incentivos à produção de resultados.

Porém, embora as acções de promoção da educação executadas no âmbito do projeto tenham sido eficazes a nível individual, não produziram efeitos do ponto de vista da modificação dos currículos escolares oficiais. Registaram-se progressos significativos em termos de promoção da ideia de um ensino contextualizado. A formação de jovens dos dois sexos para a liderança criou oportunidades de emprego e contribuiu para melhorar a gestão das associações e instituições rurais. O projeto procurou também promover a criação de serviços financeiros orientados para o mercado, dirigidos às bases e adaptados à população pobre das zonas rurais. Porém, atendendo aos objectivos do projeto, será necessária uma grande iniciativa de partilha de conhecimentos para promover o PDHC enquanto modelo de futuras políticas de desenvolvimento.

Eficiência

A entrada em vigor do PDHC atrasou-se 24 meses e foi necessário prorrogar o projeto por mais três anos e meio para compensar esse arranque tardio e os atrasos nos primeiros pagamentos. Esta prorrogação da duração do projeto esteve inevitavelmente na origem de um aumento da despesa do FIDA e do Governo com a gestão e supervisão do mesmo. Os custos operacionais do PDHC resultaram principalmente da grande cobertura geográfica prevista na concepção do projeto, que era, contudo, essencial à realização do objectivo de aplicação do modelo proposto em vários contextos. O alargamento do PDHC a outros territórios verificado no final do projeto não contribuiu para  aumentar a eficiência.

Os recursos disponíveis foram geridos eficientemente, graças à aplicação eficaz de um sistema auto-controlado em que os mobilizadores sociais, as associações das bases e os prestadores de assistência técnica se supervisionavam mutuamente, assegurando assim uma utilização óptima dos recursos disponíveis. No que se refere aos custos do modelo-piloto de assistência técnica aplicado pelo PDHC, os custos médios por família-alvo estavam alinhados com os custos médios nacionais, mas os serviços prestados pelo PDHC eram mais alargados e mais eficazes em termos de obtenção de resultados.

Impacto na pobreza rural

O impacto do projeto na pobreza rural foi satisfatório.

Principalmente, o projeto teve um impacto forte na capacitação e na auto-estima de grupos-alvo como os das mulheres e dos jovens. Este resultado foi consequência de factores como a gestão directa dos recursos financeiros dedicados às actividades de desenvolvimento e o reforço da participação nos mercados e nos processos de decisão a nível local. No que se refere às mulheres, o PDHC contribuiu para um alargamento das suas funções sociais, promovendo a participação das mulheres em actividades de produção e de geração de rendimentos, em combinação com actividades de promoção da educação e dos direitos civis. Outro dos grupos-alvo do PDHC era o dos jovens, com o objectivo de lhes proporcionar perspectivas de construção de um futuro melhor no Nordeste rural.

A avaliação permitiu comprovar o aumento da produtividade agrícola e a diversificação da produção agrícola nos territórios-alvo. A melhoria do acesso à água foi um factor importante que contribuiu para obter esses resultados. O PDHC promoveu a participação dos beneficiários da reforma agrária e dos agricultores familiares nos mercados locais, com consequências positivas para os respectivos rendimentos e auto-estima. A parceria com a Fundação Syngenta e o projeto ELO contribuiu para melhorar a orientação do PDHC para o mercado e para promover a criação de unidades agro-industriais e feiras agro-ecológicas. O PDHC estabeleceu também uma parceria com o Programa de Aquisição de Alimentos do Governo, que passou a constituir uma fonte de rendimentos segura para os agricultores familiares. Os dados da avaliação demonstram que no fim do projeto os beneficiários do PDHC tinham aumentado os seus rendimentos para o quádruplo do seu rendimento médio em termos reais de antes do projeto. O PDHC contribuiu significativamente para estes resultados, pois uma percentagem importante desse aumento foi obtida através das actividades de geração de rendimentos apoiadas pelo projeto. Há também provas de crescimento dos activos familiares e dos activos utilizados na produção.

Estes resultados positivos foram alcançados promovendo tecnologias e factores de produção ecológicos. O princípio Conviver com o semi-árido foi um elemento essencial das estratégias de desenvolvimento económico, social e humano do PDHC. O projeto contribuiu para cultivar uma nova atitude por parte dos agricultores familiares: considerar o ambiente e os recursos naturais como parceiros do desenvolvimento a longo prazo, que exigem cuidados e compreensão.

A parceria com o GEF permitiu aumentar o impacto do PDHC no domínio da utilização dos recursos naturais. Em termos de impacto político e no desenvolvimento institucional, o projeto contribuiu para reforçar a capacidade de instituições rurais como as ONG e os sindicatos rurais, bem como a participação dos pobres nos processos de decisão política.

Sustentabilidade

Os efeitos económicos e sociais do PDHC a nível da exploração agrícola familiar têm boas probabilidades de ser sustentáveis. As acções do PDHC orientavam-se para um sistema de produção adaptado à capacidade dos agricultores familiares e centrado em produtos para os quais existia grande procura nos mercados locais.

Por outro lado, o PDHC promovia a ligação entre a sustentabilidade económica e ambiental, que se reforçavam mutuamente. O projeto provou também que os agricultores familiares tinham boas perspectivas comerciais, se dispusessem das necessárias competências, informações e capacidades. Os princípios da solidariedade nos mercados locais e as compras subsidiadas efectuadas pelas empresas estatais protegem actualmente a competitividade dos agricultores familiares e favorecem o desenvolvimento gradual da sua produção e das suas competências de comercialização. Porém, a consolidação da capacidade de produção dos agricultores familiares, a melhoria da qualidade dos produtos agrícolas e a integração com outros mercados, tais como o das pequenas e médias empresas agro-industriais que operam nos territórios-alvo, são condições necessárias para manter essas vantagens.

O PDHC aprovou um calendário de obtenção de resultados sustentáveis que ia além da vida útil prevista para o projeto. Em 2006 foram incluídas novas zonas e novos territórios, apesar de não ser possível promover aí mudanças sustentáveis antes da data de encerramento do projeto. A inexistência de uma estratégia explícita de finalização da intervenção afectou inevitavelmente a avaliação da sustentabilidade do projeto. Efectivamente, a estratégia do PDHC consistia em criar as condições para uma segunda fase do projeto que deveria conduzir à sustentabilidade. Contudo, esta estratégia era arriscada, pois uma evolução política inesperada poderia interromper esse processo.

Inovação

A concepção do projeto caracterizava-se por várias inovações, que foram postas em prática com êxito, mas que, na realidade, não constituíam inovações em termos absolutos: adopção de uma estratégia de desenvolvimento territorial, abordagem pluridimensional de redução da pobreza e participação de um amplo leque de parceiros, tais como as organizações sociais e os sindicatos rurais. Contudo, a combinação entre estas inovações e a aplicação das mesmas aos beneficiários da reforma agrária e às comunidades da região do Nordeste conferem claramente ao PDHC o carácter de um programa inovador.

Na presente avaliação foram identificadas outras duas inovações importantes: (i) uma diferenciação clara entre as funções dos mobilizadores sociais e dos prestadores de assistência técnica, que promovia a especialização e a capacidade para beneficiar as populações pobres das zonas rurais; e (ii) o conceito do projeto como instrumento que proporcionava às populações pobres das zonas rurais o acesso a oportunidades disponibilizadas no âmbito das políticas de desenvolvimento do Governo. Reconheceu-se também na avaliação que foram aplicadas a nível local e das comunidades várias inovações de pequena escala, através de parcerias com as ONG. Neste caso, o PDHC actuou como um instrumento de ampliação de inovações de pequena escala.

No que se refere à replicação e ampliação, o PDHC constituiu um exemplo para outros projetos de desenvolvimento da região do Nordeste, tendo sido utilizado como referência na concepção da política de desenvolvimento do território, em 2003. Há provas de que iniciativas executadas pelo PDHC (tais como a campanha destinada a dotar as mulheres de documentos de identificação) foram replicadas e alargadas a outras regiões do Brasil. A abordagem do PDHC pode ser replicada e alargada a outras zonas semi-áridas do Brasil ou de outros países, o que exigirá, no entanto, uma nova avaliação e a adaptação a outros contextos. Para tal será necessário um elevado potencial de empreendedorismo social, com meios suficientes para combinar diferentes agentes e políticas públicas, nomeadamente em territórios onde a capacidade institucional seja fraca.

Desempenho dos parceiros

Todos os parceiros do PDHC tiveram um desempenho satisfatório. É efectuada na avaliação uma apreciação positiva do desempenho do FIDA em matéria de supervisão directa: o FIDA foi um parceiro eficiente, clarificando aspectos da concepção do projeto e facilitando a adaptação das abordagens do projeto à evolução do contexto de desenvolvimento. Graças à parceria com o FIDA, o PDHC beneficiou do estatuto de projeto internacional, que lhe conferiu possibilidades significativas de experimentação e inovação. O FIDA deu também uma resposta rápida quando as exigências em termos de supervisão aumentaram. A qualidade da assistência técnica prestada pelo FIDA teve um impacto modesto na execução.

O Governo do Brasil desempenhou um papel importante, criando um contexto político e económico favorável à redução da pobreza rural. Os parceiros do Governo cumpriram as condições dos principais acordos de empréstimo, mas a afectação dos fundos de contrapartida atrasou a execução do projeto, na sua fase inicial. O desempenho da Unidade de Gestão de Projeto (UGP) contribuiu significativamente para o êxito do PDHC: a avaliação reconheceu, nomeadamente, a capacidade da UGP para mobilizar recursos nacionais e internacionais e para estabelecer parcerias com diferentes intervenientes. A UGP garantiu também a boa gestão financeira e contabilística do projeto.

Conclusões

Foi efectuada na avaliação uma apreciação positiva do desempenho e do impacto do PDHC. As principais razões que contribuíram para esse desempenho positivo foram as seguintes:

  • O contexto político e económico favorável em que o projeto foi executado e o compromisso de redução da pobreza e da desigualdade assumido pelo Governo.
  • A organização do PDHC, que permitiu uma modalidade de funcionamento descentralizada que aumentou os custos operacionais, mas libertou a UGP de restrições políticas e burocráticas.
  • A capacidade considerável de adaptação a novas situações do FIDA e do Governo e a flexibilidade demonstrada em matéria de alteração das preferências e estratégias iniciais, quando necessário.
  • O desempenho excepcional da UGP, que foi um dos principais factores de êxito do PDHC, nomeadamente a sua capacidade para estabelecer parcerias frutuosas com diferentes intervenientes e mobilizar recursos financeiros suplementares, a nível nacional e internacional.
  • A sequenciação correcta das actividades, em que as primeiras acções, que se destinavam a superar dificuldades importantes, permitiram que o projeto conquistasse credibilidade junto dos beneficiários e dos parceiros institucionais.

Classificação do PDHC*

Principais critérios de desempenho

 

Relevância

5

Eficácia

5

Eficiência

4

Desempenho do projeto

4,7

Impacto

 

Rendimentos e activos das famílias

5

Capital humano e social e capacitação

6

Segurança alimentar, produtividade agrícola

 

5

Recursos naturais e ambiente

5

Instituições e políticas

5

Impacto na pobreza rural

5

Outros critérios de desempenho

 

Sustentabilidade

4

Inovação, replicação e ampliação

5

Êxito global do projeto

5

Desempenho dos parceiros

 

FIDA

5

Governo do Brasil

5

ONG

5

 * Ratings são atribuídos em uma escala de 1 a 6 ( 6 = muito satisfatório; 5 = satisfatório; 4 = moderadamente satisfatório, 3 = moderadamente insatisfatório; 2 = insatisfatório; 1 = muito insatisfatório).

Recomendações

Tendo em conta as realizações positivas do PDHC, recomenda-se na presente avaliação ao FIDA e ao Governo do Brasil que seja financiada uma segunda fase do projeto. Recomenda-se ao FIDA e ao Governo do Brasil que tomem nota dos principais ensinamentos retirados da avaliação, nomeadamente no que se refere à cobertura geográfica, à estratégia de sustentabilidade e à importância a atribuir à partilha de conhecimentos.

Organização institucional. O RB-COSOP, preparado em 2008 pelo FIDA em estreita consulta com o Governo do Brasil, estabelece que "os governos estaduais serão os parceiros de preferênciapara a realização de projetos de investimento" e que "novos empréstimos serãoacordados entre o FIDA e os governos estaduais com a garantia do Governo Federal.” Considerando os resultados positivos do DHCP e sendo este mesmo um projeto multi-estados, o que exige que o empréstimo do FIDA seja gerido a nível federal, a segunda fase do projeto requer que o FIDA e o Governo do Brasil  cheguem a um acordo claro em matéria de organização institucional do PDHC-II e do nível de gestão do empréstimo concedido ao projeto. Isto deveria incluir um compromisso do Governo do Brasil para realizar, em parceria com o FIDA, o desenho do projeto eos procedimentos para as negociações e a assinatura do contrato de empréstimo. No novo projeto, devem ser identificadas as oportunidades de redução dos custos administrativos e de gestão, através da utilização de estruturas descentralizadas. Da mesma forma, e em conformidade com a lógica do RB-COSOP, devem ser tidas em conta as oportunidades de cooperação e participação a nível dos governos estaduais, a fim de optimizar a influência potencial do PDHC-II a nível estadual.

Ligações políticas. Definir as ligações entre o PDHC-II e as políticas públicas, a nível federal, estadual e municipal, a fim de clarificar as ligações existentes e as novas ligações possíveis que permitam canalizar mais eficazmente as políticas de desenvolvimento para o sistema de agricultura familiar.

Produção e divulgação de conhecimentos. Integrar na concepção do projeto uma estratégia de produção de conhecimentos, com vista a aumentar os conhecimentos extraídos da experiência. Para  tal será necessário um sistema de acompanhamento e avaliação orientado para os resultados, que permita medir os progressos do projeto em termos de execução da abordagem proposta, bem como os resultados alcançados a vários níveis (género, etnicidade, idade, famílias e instituições). A nova fase deverá integrar instrumentos que permitam extrair informações da experiência do PDHC, a fim de divulgar esses conhecimentos em fóruns nacionais e internacionais. Neste contexto, o FIDA deve promover e multiplicar as oportunidades de transferência da experiência do PDHC a nível regional, bem como no âmbito de iniciativas futuras de cooperação Sul-Sul.

Apoio à geração de rendimentos nas zonas rurais. O projeto deverá incluir estratégias de geração de rendimentos, através de actividades agrícolas e não agrícolas. No que se refere às actividades agrícolas, deverá ser prestado apoio ao melhoramento de produtos de elevado valor acrescentado e promover as ligações dos agricultores familiares à cadeia de valor e aos mercados. Estas actividades deverão ser executadas de forma coerente com o princípio da preservação do ambiente, que foi uma das características distintivas do PDHC. Deverão ser também identificados no âmbito do projeto instrumentos e estratégias de expansão das oportunidades de emprego noutros sectores além da agricultura, especialmente para os jovens. Nestes dois contextos, o projeto deverá continuar a apoiar iniciativas destinadas a facilitar o acesso dos beneficiários a serviços financeiros e não financeiros de desenvolvimento da capacidade profissional e empresarial, dirigidos às bases.

Gerir para a sustentabilidade. Definir à partida a estratégia de intervenção junto dos assentamentos e das comunidades e a respectiva duração. Será assim necessário definir o tipo e a duração do apoio e os indicadores que desencadearão a finalização do apoio ao projeto – a estratégia de saída. Deverão ser especificadas na concepção do projeto as características e condições que se deverão verificar à data de conclusão do projeto, a fim de assegurar que os benefícios do projeto se mantenham após o fim do financiamento do mesmo.

Maximizar as sinergias com o programa do FIDA para o país. Quando aplicável, procurar complementaridades entre as acções do PDHC e a experiência de programas do FIDA executados nos mesmos estados e territórios.

 

Brazil: A multi-dimensional approach to rural poverty reduction (Issue #77 - 2011)
Brazil: System-building and leveraging state policies for the development of family agriculture (Issue #17 - 2011)

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